Taí uma pergunta que não quer calar desde que vi o caso da menina Joana Marins no Fantástico, no domingo passado. Quem foi o desgraçado que tirou a menina da casa da mãe para entregá-la a um pai com histórico de violência, inclusive contra a própria criança? Como um magistrado chega a uma decisão dessas, negando à mãe o direito de visita à filha por 90 dias? A imprensa relata a existência de inúmeros boletins de ocorrência relatando constantes brigas entre o pai de Jonna e sua atual esposa, inclusive provocadas pela intolerância desta à presença da menina. Falam de uma cadeira que a madastra havia quebrado nas costas do pai porque ele daria uma festa de aniversário para a filha - coisa de gente super equilibrada...
Se eu fosse a mãe, tentaria responsabilizar o Judiciário. Não porque alguma recompensa financeira possa aplacar a sua dor. Nenhum dinheiro no mundo diminui a dor de uma mãe que perdeu um filho, e isso eu posso dizer pois quase perdi o meu e sei que não haveria consolo para essa perda. Ainda mais uma perda nessas circunstâncias, em que a tragédia era anunciada. Eu responsabilizaria o Judiciário para evitar que futuras tragédias como essa destruíssem outras famílias e, sobretudo, porque juiz tem que ser responsável pelos seus atos. Simples assim.
Se eu, como advogada, causo dano a um cliente por negligência, imperícia ou por erro grosseiro, ou um médico comete erro médico comprometendo seu paciente, ninguém hesitaria em nos responsabilizar pelos danos, pois estariam presentes todos os elementos necessários ao dever de indenizar: uma ação ou omissão, um dano, e o nexo causal que relaciona a ação ou omissão ao estrago feito. Porque não ocorre o mesmo com o trabalho do magistrado? Não deve ele ter o mesmo dever de zelo e cuidado no desempenho do seu ofício?
Buscando resposta para a minha pergunta, soube que o juiz, na verdade, é uma juíza, a Dra. Claudia Nascimento Vieira, do Rio de Janeiro. A Dra. Cláudia, é humana como todos nós, e comete erros, como todos nós. Pode ser que a Dra. Cláudia tenha filhos na escola, ou aula de tênis ou de pilates, ou tenha que levar os filhos na aula de inglês, ir ao supermercado, ao cinema, na manicure, ou seja, pode ser que ela tenha que fazer as coisas que toda mulher tem que fazer... Então, aquele processo estava à sua mesa, aguardando uma decisão, e tinha que ser lido inteirinho, e com todo o cuidado por tratar de interesse de menor. E olhem o que diz o art. 227 da Constituição: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão" (grifei).
Chega a me doer digitar esse dispositivo pensando na Joanna. A Constituição utiliza a expressão "prioridade" uma única vez em todo o seu texto, justo quando trata da proteção ao menor. Por triste contradição, a Dra. Cláudia, que É o Estado, terminou submetendo a menina a tudo isso: negligência, violência, crueldade, opressão, tudo culminando na sua morte. Que horror. Será que Sua Excelência dorme de noite?
Pois é, o processo devia estar lá, junto com outros mil. Mas Sua Excelência também tinha que pegar os filhos na escola, ir na aula de pilates, no supermercado, ou qualquer dessas outras coisas que todo mundo tem que fazer. Isso é a realidade do Judiciário: pessoas como nós. Só que um magistrado, se não consegue fazer tudo o que tem que fazer e ainda decidir a vida dos outros decentemente, pelamordeDeus: NÃO SEJA MAGISTRADO! Escolha um atividade que não repercuta, de forma imperativa, na vida dos seus semelhantes.
É chavão dizer que todos têm o direito de errar, mas quando se diz isso, sempre pensamos em erros cujas consequências recaiam sobre nós mesmos, sujeitos ativos do erro. Errar com a vida dos outros, impor as consequências dos nossos erros aos outros, isso é uma desumanidade e, pior, uma tremenda injustiça...
...Algo totalmente incompatível com a função daqueles que, justamente, estão comprometidos em fazer JUSTIÇA.
Essa é a pergunta que não quer calar. Muito bem abordado e escrito. Por que tu não mandas para zero hora? Seria bom que milhares de leitores reflitam sobre isso, inclusive muitos juízes...
ResponderExcluirAna Paula J.
Mandei pro CJN, órgão encarregado de fiscalizar o Judiciário. ZH, um dia, quem sabe... O problema é que a magistratura é muito corporativista e um artigos desses no jornal pode ser um suicídio profissional!
ResponderExcluirSou juíza e desde o primeiro minuto fiquei revoltada com a irresponsável decisão desta magistrada, que evidentemente é despreparada para o ofício ou, ao menos, para exercê-lo em uma vara de família onde não se trata de dinheiro ou bens. Ela tratou uma criança como um animal cuja posse é disputada por dois vizinhos em um juizado especial qualquer.
ResponderExcluirNão é preciso dizer mais do que você disse, apenas acredito ser necessária uma representação formal ao CNJ. Nós somos representados todos os dias pelos mais variados e míseros motivos. Este caso deve sim chegar até lá.
Te peço, faça isso, inclusive em nome dos magsitrados que sabem o tamanho da barbárie que foi esta decisão.
Um abraço e parabéns pelo seu blog.