Estávamos todos lá, professores da Faculdade de Direito -- alguns de nós professores de um Curso de Mestrado em Direitos Humanos -- numa discussão de alto nível intelectual sobre a operação que capturou e matou o líder do Al Qaeda, Osama Bin Laden.
De um lado, aqueles que destacavam o desrespeito aos direitos humanos pelos Estados Unidos (que deveriam, supostamente, dar o exemplo de proteção) por atirar em um sujeito que, nas circunstâncias, encontrava-se indefeso ou, senão tanto, sem condições de oferecer resistência "à altura". Diziam que uma nação que pretende ser o norte de civilidade e respeito aos direitos de liberdade deveria ter levado Bin Laden a um julgamento nos padrões ocidentais, dentro do due process of law, que seria tudo o que ele repudiava. Assim, daríamos ao mundo a prova definitiva de que a civilização ocidental tem condições de fixar os standards éticos universais na proteção dos direitos do indivíduo.
De outro lado, defendia-se a operação sob os mais diversos pontos de vista. Do ponto de vista estratégico, defendia-se que a ordem para matar Bin Laden consistia em damage control e não poderia ser de outra forma, pois mantê-lo preso aguardando julgamento estimularia uma série de novos atentados, além da já conhecida chantagem para a libertação de prisioneiros capturados, que consiste basicamente em atentados à bomba ou sequestro, tortura e assassinato de civis ocidentais, tudo televisionado para a internet, com o fim de demonstrar que os malvadões são os militares americanos que não libertam os presos do Al Qaeda. Uma espécie de estado de necessidade. Do ponto de vista jurídico, destacava-se a proteção dos direitos humanos dos cidadãos americanos, que tiveram os sagrados direitos à segurança e ao sossego ceifados por Bin Laden no terrível ataque às torres do World Trade Center e que, desde aquele triste episódio, vivem sob constante ameaça. Daí se avançou na discussão para determinar se a constante ameaça imposta pelo terrorismo preenchia o conceito de ameaça injusta, atual e iminente, o que então justificaria uma atuação em legítima defesa (da nação)...
Tudo muito técnico e politicamente correto (como são quase sempre as discussões em torno dos direitos humanos) e todos nós muito controlados para nos mantermos dentro dos padrões de objetividade que uma discussão séria idealmente exige... Até que alguém fez o seguinte comentário:
"-- Para mim, a operação teve um único defeito: os americanos deveriam ter torturado o Bin Laden antes de matá-lo. Só matá-lo foi um fim muito simplório para um questão tão complexa..."
O tom foi de brincadeira e mudou o rumo da discussão, afinal, abriu-se uma fenda na represa e o lado humano de cada um começou a jorrar que nem a água das Cataratas do Iguaçu. Aí foi o concurso da "brincadeira" mais politicamente incorreta, sendo as brincadeiras o inocente condutor do nosso lado mais visceral, vingativo, cruel e justiceiro. Foi também a parte mais divertida daquela manhã, pois meus amigos e eu somos, realmente, criativos.
Moral da história: existem os diretos humanos. Mas também o lado humano de cada um.
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